sábado, abril 29, 2006

Anos atrás, quando ela ainda era viva, procurava manter meus deveres de neto zeloso em dia e semanalmente lhe telefonava. O inicio da conversa, quase sempre era:
- Oi vó!
- Oi filho!
- Tá sózinha, vó?
- É filho, tava na cozinha.
Tinha problemas de audição, um dos efeitos da sua diabetes. Bom, não tenho certeza que fosse problema da diabetes, que de doença não entendo nada, só ganho do nosso presidente, que parece entender menos que eu. Mas, continuando.
- Não vó, perguntei se está SÓZINHA?
- Ah! Não filho, tô eu e Deus.

Hoje à noite em casa, enquanto saboreava a pizza de aliche do Pane & Vino aqui de Jarinú, aliás uma das melhores pizzas de aliche que já comi, junto com um vinho Argerntino, bastante honesto, ou seja razoável e barato, me lembrei dela e imaginei uma ligação sua:

- Oi filho!
- Oi vó!
- Tá sozinho?
- Não vó, tô eu e meus pensamentos.

sexta-feira, abril 28, 2006

Motivação

Soltei um gemido
Contido, sentido gemido
Sem ser de gozo, não
Nenhuma nova forma de expressão
Simples falta
De motivação
De motivo à ação

Um simples pretexto
Para uma nova canção
Que fale de tudo pra nada
Estilo poético, forma rimada
Simples falta
De motivação
De um motivo são
De motivo à ação

Se gostou do aperitivo acima, sirva-se do prato principal aqui.

segunda-feira, abril 24, 2006

Paixão Antiga


Eu gostava muito de futebol quando garoto. Gostava tanto que inventei um jogo de futebol com pilhas. É, pilhas de rádio. As populares ray-o-vac de um lado, as eveready do outro e, como goleiros, algumas mais raras que eu sempre procurava colecionar. Gostava de montar campeonatos de várzea, que na época tinha times que eram conhecidos e admirados, com torcida e tudo. Me lembro do Continental, do 7 de Setembro, do 1. de Maio, do Vila Invernada (bairro em que morava), e outros que inventava. Fazia a tabela de jogos e, diariamente ocorriam um ou dois jogos do campeonato fictício, que eram verdadeiros clássicos. Os gols, eram emprestados do futebol de botão, jogo que achava muito parado, perto da nova modalidade que inventara. Dispunha as pilhas sobre o tapete da sala, onde passava horas, treinando jogadas, e finalmente, executando os jogos que consistia em passes milimétricos, dribles desconcertantes e cruzamentos para cabeçadas certeiras no ângulo, as vezes defendidas de forma ‘miraculosa’ pelo goleiro. Não me perguntem como fazia isso, mas lembro perfeitamente que as jogadas saiam. Minha mãe, além de reclamar dos invariáveis rasgos que essa brincadeira ajoelhado no tapete causava nas calças, o que fazia com que andasse sempre com reforços de couro na altura dos joelhos, devia achar muito estranho seu filho querido, brincando sozinho com aqueles craques imaginários. Sim porque cada pilha tinha uma característica e uma personalidade próprias, havendo aquele becão de fazenda, geralmente as mais sujas e velhas, e o centroavante goleador e ídolo da torcida, sempre limpinho e reluzente. E com direito a narrações emocionadas, onde imitava os jargões de meus cronistas esportivos prediletos como Fiori Giuliotti (o tempo passa, torcida brasileira!).
Bom mas isso é só uma introdução pra falar de um grande amor da minha infância, lá pelos 11, 12 anos. Foi o time do Botafoguinho. Pelo que me lembre quem teve a idéia de formar o time foi o Marcos, que era goleiro da seleção da escola, e seu irmão Julinho, que tinha um estilo muito elegante de jogar. Só que o critério pra montar o resto do time era o de amizade. Então entraram vários pernas de pau como eu, o Fesnedinha e seu irmão caçula, filhos do seu Fesneda, alfaiate do bairro, e outros que não consigo recordar. Nosso uniforme era a gloriosa camisa do time da estrela solitária do Rio. Ninguém sabia ao certo porque esse foi o uniforme escolhido, mas todos nós gostávamos da camisa alvinegra listada.
Nossa principal rotina era nos encontramos aos sábados a tarde, todos devidamente com os uniformes e tênis, alguns usavam chuteiras, tudo impecavelmente limpo, e rumarmos para os campinhos de terra batida, na verdade terrenos baldios, que haviam no bairro.
Invariavelmente nosso adversário de nove em cada dez jogos era a turma do Tonhão. Invariavelmente, também, o resultado eram uniformes sujos, e mais uma derrota avassaladora.
Lógico que haviam as acaloradas discussões sobre quem era culpado de que, quem não tinha dado sangue o suficiente pra evitar a humilhante derrota, promessas de nunca mais jogar naquele time de panacas, e outros bate boca. Mas não adiantava, no sábado seguinte estávamos todos juntos e sempre os mesmos, sem pensar em ‘reforços’, procurando e desafiando os adversários que aparecessem, que claro, era sempre a turma dos pés descalços e descamisados do Tonhão.
Acho que de tanto que apanhávamos, na bola bem dito, porque nunca houve briga entre nós, e por nunca desistirmos, começamos a ter o respeito do nosso tradicional adversário. Houve até mesmo um dia em que, provavelmente por algum desfalque, talvez até premeditado do Tonhão, conseguimos empatar um jogo, no último minuto. Foi uma festa, comemorada como se fosse decisão de campeonato com conquista de título.
Não sei dizer pelos outros amigos, que já perdi contato, mas pra mim, se nossa trajetória futebolística não fosse essa incrível coleção de derrotas, talvez a lembrança dessa época não estivesse presente ainda hoje. O importante era a sensação de fazer parte de um time, o orgulho de estarmos todos uniformizados, o exercício da amizade e, principalmente, porque, a cada novo jogo tínhamos a esperança que, daquela vez, seria diferente e, com certeza, daríamos o melhor de nós para conseguir o objetivo da vitória.

P.S. Esse texto não tem nada a ver com a derrota do meu time, o Palmeiras, antes que
algum engraçadinho venha a fazer a correlação. Mesmo porque, não consigo mais ver
graça em torcer por times que mudam totalmente ao final de cada campeonato. Estão
inteiramente fora do espírito do meu Botafoguinho.

sexta-feira, abril 21, 2006

Ouro de Tolo
Raul Seixas

Eu devia estar contente
Porque eu tenho um emprego
Sou um dito cidadão respeitável
E ganho quatro mil cruzeiros por mês
Eu devia agradecer ao Senhor
Por ter tido sucesso na vida como artista
Eu devia estar feliz
Porque consegui comprar um Corcel 73
Eu devia estar alegre e satisfeito
Por morar em Ipanema
Depois de ter passado fome por dois anos
Aqui na Cidade Maravilhosa
Ah! Eu devia estar sorrindo e orgulhoso
Por ter finalmente vencido na vida
Mas eu acho isso uma grande piada
E um tanto quanto perigosa
Eu devia estar contente
Por ter conseguido tudo o que eu quis
Mas confesso abestalhado
Que eu estou decepcionado
Porque foi tão fácil conseguir
E agora eu me pergunto: e daí?
Eu tenho uma porção de coisas grandes
Pra conquistar, e eu não posso ficar aí parado

Eu devia estar feliz pelo Senhor
Ter me concedido o domingo
Pra ir com a família ao Jardim Zoológico
Dar pipoca aos macacos
Ah! Mas que sujeito chato sou eu
Que não acha nada engraçado
Macaco, praia, carro, jornal, tobogã
Eu acho tudo isso um saco
É você olhar no espelho
Se sentir um grandessíssimo idiota
Saber que é humano, ridículo, limitado
Que só usa dez por cento de sua
Cabeça animal
E você ainda acredita que é um doutor, padre ou policial
Que está contribuindo com sua parte
Para o belo quadro social
Eu que não me sento
No trono de um apartamento
Com a boca escancarada cheia de dentes
Esperando a morte chegar
Porque longe das cercas embandeiradas que separam quintais
No cume calmo do meu olho que vê
Assenta a sombra sonora de um disco voador

Estou com essa música na cabeça esses dias. É que troquei de carro, e lembrei do Corcel 73. No meu caso não é status, é contenção econômica, em função do aumento com gasto com combustível, precisei optar por um modelo flex pra tentar aproveitar a passageira economia do álcool, que já foi pra cucúia. Essa música me marcou muito na época de seu lançamento, acho que 74/75. Era adolescente e lembro que fazia muito sucesso. Era tocada direto nas rádios. O Raul ia aos programas de auditório, tipo Chacrinha, Bolinha e outros. Foi um verdadeiro hit. Eu ficava encucado. Não entendia o sucesso, porque achava a música um verdadeiro soco no estômago das pessoas.
A música fala da maior das revoluções que pode ocorrer: a revolução interna da eterna insatisfação. No caso, não a insatisfação material (“porque foi tão fácil conseguir e agora eu me pergunto: e daí?). Se tudo foi feito usando apenas dez por cento da minha cabeça animal, qual a graça? O que resta: sentar “no trono de um apartamento com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar”?
Na época, o que mais queria era minha independência (física e financeira) da família. Não que não gostasse deles ou que tivesse grandes traumas de convivência. Apenas achava que a minha realização pessoal teria que ser feita a revelia do que esperavam.
Sei que isso tudo pode soar meio anacrônico, nessa altura do campeonato mas, como disse no primeiro post, esse blog tem como um dos objetivos “economizar com psicólogo”, então preciso voltar no tempo e achar o elo perdido.
Um dos componentes é a tal da “realização profissional”. Trabalho numa área (análise de sistemas) que não posso dizer que foi minha vocação natural. Até aí acho que 90% da humanidade me acompanha. Mesmo porque, esses 90% não sabe, ou não desenvolveu, sua vocação natural. A minha eu gostaria que fosse a música, mas a falta de certo talento e um auto-senso crítico exacerbado me fizeram desistir de tal forma que hoje fazem anos que não toco nada.
No inicio, a sensação do trabalho bem feito, o reconhecimento e as conseqüentes promoções, a evolução natural da vida afetiva, filhos, a acumulação patrimonial, tudo trabalhava a favor da atenuação dos conflitos internos.
Mas tudo aquilo que não se resolve, conspira para um dia retornar (dizem que FREUD explica). Atualmente estou fechando mais com REICH.

P.S: esse texto foi escrito no inicio do ano e não publiquei porque achava que deveria desenvolver mais. Mas, não há muito o que acrescentar. Então, o negócio e passar a regua nessa sequencia de posts 'eu & meu umbigo', e seguir viagem, afinal, estou aqui só de passagem mesmo.

quinta-feira, abril 20, 2006

Esclarecimento

Bem, vamos tratar de desfazer mal entendidos, antes que seja tarde. O post anterior não é meu. Transcrevi um artigo públicado na Folha de São Paulo (Caderno folha ilustrada) de outubro de 1981, de um tal de Paulo José de Moraes, e não tive tempo de colocar esse complemento, porque, no dia, o blogger saiu do ar , e ontém eu é que estava fora do ar. Fiz uma pesquisa no G oogle e não achei nada sobre o autor do texto. Ou seja, bem que poderia tomar posse, já que admiro quase tudo que está ali escrito, inclusive a forma, digamos, mais arrebatadora. Esse pequeno pedaço de papel, já bem amarelado, me acompanha até hoje, sobrevivendo a várias mudanças, onde várias outras coisas foram perdidas, juntamente com algumas cartas, da época em que se escreviam cartas para os amigos.
Gostaria apenas de contextualizar aquele momento. O país vivia os extertores da ditadura militar. Começavam as discussões pelas eleições diretas. A economia caminhava para a recessão com inflação altíssima. Havia muita impaciência no ar, principalmente entre os mais jovens. Pessoalmente, estava completando os últimos créditos da Faculdade de Geologia, e já sabia que a crise do emprego seria ‘braba’ no ano seguinte, com o fechamento da Paulipetro, empresa paulista estatal, criada pelo então Governador Paulo Maluf, para explorar petróleo no Estado de São Paulo e adjacências (área da Bacia do Paraná). Se bem me lembro, achou gás que, se extraido, sairia a preço de ouro.
Dentro desse contexto, assim que li o artigo, recortei e guardei, com o compromisso de procurar seguir o mais fielmente possível suas propostas pela vida afora. Enquanto transcrevia pensava, porque estou relendo isso, quase vinte e cinco anos depois? Sei lá. Pra mim talvez seja ‘uma roupa velha que não me serve mais’, mas espero que para meus filhos esse texto sirva de alerta pra vida deles. Tinha mais coisas que queria falar mas, agora licença, que fui convocado pra uma reunião. Blogar no serviço não é mole.

terça-feira, abril 18, 2006

Esta Vida É Louca

“Esta vida é muito louca, e loucura pouca é bobagem” (Rita Lee).
Biafra, Claus, Wanderlei, Marcelo, Igor (que por sinal está na Europa), Azael e Escova e Rogério (que dão a maior força) e Mané – gênio louco da coreografia da vida, e ainda todos nós que fomos ouvi-los e vê-los – e o “Premeditando o Breque” (“Premê”) constituímos o show bem chamado de “Sem Vergonha”, que sem dúvida muito louco e divertido, pintou para resgatar o humor necessário com que se deve tratar a vida.
E, a partir desse comercial descarado e, por que não, “professori”, sem vergonha, é que estou falando de resgate. Segundo o Aurélio, a palavra resgate quer dizer: 1. Ato ou efeito de resgatar(-se). 2. A quantia necessária ao resgate de escravo, prisioneiro, dívida, etc. 3. Libertação, livramento.
É por aí. Ir a luta para resgatar o nosso humor, o nosso amor, o nosso suor, a nossa liberdade, a nossa cidade, a nossa amizade. Tentar conquistar (e, muitas vezes, o preço é caro e dolorido) nossa pessoa. Com todos o elementos perceptivos presentes. Nossa visão que, embotada, não via mais o brilho de um olhar no escuro. Nossa audição que, colonizada, não ouvia mais nossa própria respiração. Nosso paladar que, industrializado, não sentia mais o gosto da saliva. Nosso olfato que, em práticos e eficientes sprays, perdeu a capacidade de diferenciação entre o natural e o artificial. Nosso tato que, enluvado, não achava mais o tato do outro. Nossa vergonha que, transformada em falsa ousadia e ansiedade, passou a ser desavergonhada (o que é muito diferente de sem vergonha). Nosso humor que, sem graça, passou a ser piada. Nosso amor que, embalado e vendido em horários nobres, passou a ser imitação de atitudes ao invés de ser criativo e bonito. Nosso suor que, contido, passou a ser pecado. Nossa liberdade que, ausente, passou a ser subversiva. Nossa cidade que cresceu e se esqueceu. Nossa amizade que era frágil e se quebrou.
Resgatemos nossa loucura, para fugir dos padrões oficiais que determinam o que é saúde (principalmente a mental) e predeterminam a doença social do medo, que esconde a condição de oprimido.
Libertemo-nos das normas e regras que desejam nosso bom comportamento, oferecendo em troca, nossa possibilidade de, ao final da vida, sacar que a morte não nos rende juros nem correção monetária para nada.
Meditemos, irmãos, e premeditemos nosso breque. Pára com isso, vê se acorda, tudo é perigoso, tudo é divino-maravilhoso, hoje é o primeiro dia do resto de nossas vidas, e isso é bom que mete medo, e se mete medo é bom, isso é bom barbaridade.
A poesia não tem linguagem, e talvez o poeta seja aquele que não durma mais que o necessário, somente o necessário. Lembra do urso do Mowgli? E lembra da risada da criança que assistia o filme ao seu lado, entendendo tudo que você não compreendia?
Eu quero mais é acordar sem ser chamado pelo despertador, pois ele foi programado não para me acordar, mas sim para manter meu sono. E não quero mais saber de levantar sem espreguiçar, trabalhar sem gostar, passar o dia sem saber de nada, amar sem mim e sem você, dormir sem ter ficado acordado.
Os que controlam nossas vidas só querem mesmo que a gente fique dormindo, acumulando nossa produção criativa para o dia seguinte, enquanto eles acumulam outros valores capitalizados em cima de nosso sono. Chega de achar que a melhor coisa do mundo está fora de nosso alcance. Se formos afins, nós resgatamos qualquer coisa. Deixamos de ser escravos, fugimos dessa prisão, pagamos essa dívida para com o prazer de estar vivos. Livramo-nos da condição numeral a que fomos estabelecidos. Percebemos o amor que está dentro da gente, e querendo explodir junto com o amor de quem está do nosso lado, e tocamos fogo nesse apartamento, damos mais um gole na pinga com limão que está a nossa frente, fazemos mais uma matéria na pós-graduação para poder saber de nós, e lemos mais um livro, levamos mais um papo, ouvimos mais uma conferência, dançamos mais uma música, saímos para a luta contra o que não nos permite ser livres, e aí, cansados do dia cheio, com o corpo pedindo cama, resgatamos nosso sonho no meio das carícias. No sonho o Zico pega a bola, passa para o Sócrates que devolve de calcanhar, vem o passe para nós, que somos centroavantes, e, de esquerda, mandamos para o fundo do gol. E vendo a cara desconsolada dos adversários, e não ligando para o cartão vermelho do juiz, da Fifa, do político, do coronel, dos donos da verdade, dos que são “autoridade”, damos um enorme abraço, beijamo-nos, formamos um tronco humano no meio do campo, com a geral invadindo o gramado e juntando-se a nós, embolando tudo, começando tudo de novo, resgatando a liberdade, e saindo pro carnaval, que vai durar até bem depois do carnaval.

sexta-feira, abril 14, 2006

Mundo Animal


Quase sempre eu fico pensando o que escrever nesse blog. O que poderia acrescentar nesse mundo em que tantos dizem tantas coisas, alguns de forma brilhante, outros nem tanto. Foi quando, algumas semanas atrás eu tive uma visão, que acho que poucos tiveram a oportunidade de presenciar. Pensei: isso vale um post. Mas acabei esquecendo, mas hoje, me veio a lembrança novamente, posto que aconteceu de novo. Então acho que o mundo merece saber.
Meninos eu vi. Acredito que eram um macho e uma fêmea, já que nunca tive noticia de homosexualidade nesse meio.
Estava eu bebericando meu wisky a beira da piscina quando o casal alado apareceu. Eram presença constante aqui no meu habitat, mas foi a primeira vez que apareceram em par. Só que não estavam separadas. Estavam, como vou dizer... engatadas, voando à minha frente. Uma estava voando normalmente, a outra estava, digamos, de barriga pra cima, mas engatadas. Numa humana correlação, seria um 69. E zuniam de lá pra cá, daqui pra lá, num balé estonteante. Ainda engatadas, sumiram em direção a casa do vizinho. Retornaram alguns minutos depois. Era outra a posição, mas tenho certeza que eram o mesmo par. Agora uma estava cavalgando a outra, por trás, no mesmo frenesi. Acho que a coisa estava esquentando, porque por duas vezes elas baixaram até o nível d’água e se refrescaram, em pleno vôo, rápidamente, e continuaram no seu balé acrobático. Caramba, aquilo devia ser muito bom. Copular voando e refrescando a traseiro de vez em quando. Tudo isso durou bem uns cinco minutos, o que, considerando que não devo ter presenciado as preliminares, era um bom tempo. Parabéns às libélulas!

segunda-feira, abril 10, 2006

Duas Árvores

“Era uma vez dois vizinhos. Não tinham mais quase nada em comum além de serem vizinhos. Um era cara de garotão, casado, com um filho de mais ou menos sete anos, e um poodle sempre impecável no banho e na tosa. Era alegre, expansivo, comunicativo, etc, etc. O outro era taciturno, quieto, mais velho, cabelos ainda longos pra idade, barba e bonachão. Morava só, não totalmente, porque tinha dois vira-latas que passavam a maior parte do dia na rua. Diziam que tinha filhos que poucas vezes foram vistos na casa. Os dois tinham um jardim, que de certa forma refletia a personalidade de cada um, como não deveria deixar de ser.
Por uma dessas coincidências que só acontecem nos contos da blogsfera, ambos se encontraram no caixa de uma loja de plantas e, pasmem, ambos estavam comprando uma muda da mesma espécie de árvore. Ficaram sabendo que ambos pensavam em planta-las na frente da casa de cada um. E assim foi feito.
Passaram a se cruzar quase que diariamente. Enquanto um, vocês sabem qual, estava sempre regando, tirando as ervas daninhas, podando os galhos que teimavam em fugir a estética que ele planejava para a árvore, colocando estacas para garantir um crescimento sempre reto e pra cima, o outro ficava a maior parte das vezes apenas contemplando a planta. As vezes parecia até conversar com ela, afinal era um cara meio estranho mesmo.
E assim se passaram alguns anos e as diferenças já eram notáveis. Enquanto uma estava frondosa, cheia de galhos e folhas sempre verdejantes, com uma copa que parecia esculpida pelo ‘Edward mãos de tesoura’ do Tim Burton, a outra, coitada, pensava o nosso vizinho, estava mais pra raquítica, com galhos que pareciam brigar um com o outro, cada um pendendo pra um lado, o tronco curvado e retorcido.
Mas eis que um dia, e sempre existe um dia, mais especificamente foi uma noite, já madrugada, houve um temporal além do normal na região. Ventos em rajadas violentas e chuva torrencial que encharcaram e inundaram vários pontos da cidade.
Na manhã seguinte nossos vizinhos ao saírem de casa checkaram os estragos. Nosso amigo zeloso, ficou estarrecido ao ver sua bela árvore arrancada do seu lugar e arremessada do outro lado da rua. Enquanto o outro verificou apenas alguns galhos quebrados e outros caídos ao pé da sua.
Aí o garotão não se conformou e resolveu abordar o barbudo.
- Escuta, me explica como pode a sua árvore ter resistido tão bem ao temporal, enquanto a minha foi totalmente destruída.
O outro foi observar a árvore arrancada e o local onde ela estava plantada. Em seguida,
entrou na sua casa e voltou com uma enxada e uma picareta e começou a fazer um buraco,
cerca de um metro longe do tronco da sua árvore. Cavou fundo, quase um metro pra baixo
também, até encontrar a raiz dela. Em seguida mostrou pro vizinho.
- Veja, a sua árvore está com uma raiz muito pequena e superficial, enquanto que está outra tem uma raiz ramificada e profunda. Isso fez toda a diferença quando elas tiveram que suportar a força da tempestade.
- Mas eu sempre cuidei e protegi minha árvore durante toda seu crescimento, enquanto que você, eu via, nada fazia pela sua. Como que pode ter havido essa diferença.
- Bom, acho que enquanto a sua tinha tudo de um modo fácil e abundante, essa aqui, eu sempre dizia pra ela, que era bom se virar pra achar água e os demais nutrientes no solo onde estava. Acho que ela entendeu o recado e tratou de, embora penalizando a folhagem externa, desenvolver raízes fortes a fim de encontrar a melhor maneira de sobreviver.”

Esse texto é uma livre, e bota livre nisso, principalmente nos aspectos botânicos da coisa, recriação de outro que recebi, via e-mail, uns dois anos atrás. Se tinha autoria, não lembro qual. Ficou na minha memória, principalmente pelo ponto de vista diferente que ele contém. Mas acho que cai como uma luva para a educação, principalmente de filhos. Posso afirmar que não acompanhei como gostaria a educação, por exemplo escolar, dos meus filhos, mas as mães com as quais convivi, que frequentavam com assiduidade as reuniões escolares, sempre ressaltaram o fato, na maioria das vezes irritante, de certos pais acharem os seus filhos o centro do universo. De acharem que a escola estava sempre sendo injusta e enérgica demais nas suas avaliações e medidas disciplinares. Tiravam toda e qualquer autoridade dos professores e da direção. Não que eu defenda o autoritarismo na formação escolar, muito pelo contrário. Ainda pretendo escrever aqui sobre algumas experiências pedagógicas alternativas que vão muito mais de encontro ao que penso sobre o tema. Mas a metáfora desse conto acho totalmente valida no que diz respeito ao aspecto da super-proteção na educação.

sexta-feira, abril 07, 2006

Tempos Modernos (final)

Ele já havia deixado o prato de lado e tentava reunir forças, bebericando do vinho, pra fazer a sua parte do combinado.
- A tática foi a mesma, só não consegui carregar o Edson, na sexta, que disse precisar trabalhar no sábado, e não estava a fim da esticada. Resolvi ir sozinho mesmo e, por falta de prática cheguei cedo, com o bar ainda vazio. Quando o clima esquentou é que percebi que havia me excedido na bebida e, você sabe, quando o estomago dá o berro a coisa fica crítica. Tive que gastar boa parte da noite trancado no banheiro, tentando me recuperar. Foi um fiasco total, e fui embora a ver navios. No dia seguinte, devidamente escoltado pelo amigo, e me controlando melhor, percebi um olhar, mas sem sorriso, dela que estava com outras duas amigas. Notei que das três era a mais quieta, o que me cativou naturalmente. Fiz a abordagem, meio desajeitado, mas consegui manter a conversa e leva-la para casa. Mas não senti clima para avançar o sinal. Marcamos um cinema para o dia seguinte. Nesse quesito tínhamos afinidades e fomos ver o Woody Allen que estava passando. Ao contrário do seu ‘barriga de tanquinho’, ela estava muito interessada em conhecer meu passado. Notou por exemplo a marca da aliança, que havia deixado em casa. Não teve jeito. Menti que era separado já a seis meses, que tinha um filho, uma ficha quase completa. Pintou um clima de cumplicidade e, ficamos de nos ligar durante a semana. Na seguinte, mais cinema e restaurante, a conta estava começando a ficar cara, pro Salim aqui. Foi a vez dela se abrir e contar suas desventuras amorosas, sua preocupação com a idade já avançada e ainda vivendo com os pais, apesar da independência financeira. Os esforços para se manter bela e atraente, seus medos de se envolver, mais uma vez, com a pessoa errada, mas achando que eu era diferente’, e eu já começando a me achar um crápula. Nos despedimos, até a próxima semana, que era a última do meu prazo. No telefonema no meio da semana notei que ela estava diferente. Deu a entender que queria conhecer minha casa, já que eu tinha dito que morava numa chácara, em cidade próxima da capital. Mas achei que isso estaria fora de propósito, não é?
- Ahn, Ahn!
- Foi o que pensei e deu uma desculpa que nem me lembro agora. Ela achava que eu estava escondendo alguma coisa. Por exemplo, porque quase não falava do filho, já que estava separado e, pela sua experiência, homens recém separados adoram falar dos filhos, talvez uma maneira de purgar suas culpas. Procurei desconversar e dei a entender que não daria pra continuar se ela continuasse com as desconfianças. Desliguei achando que era o fim, mas, na sexta ela liga e diz que queria sair novamente, afirmando que a desconfiança havia sido superada. Aí foi a minha vez de ficar preocupado com o rumo que as coisas estavam tomando. De qualquer forma concordei, e ficamos de nos ver à noite, sem programa definido. Ao pegá-la, não disse nada e, cheio de brios ‘cafajésticos’, me dirigi ao motel mais próximo. Ela não opôs resistência, parecia mesmo que era o que esperava que eu fizesse, considerando o sorriso maroto e o cafuné enquanto fazíamos a ficha.
- Lá chegando, entrei com o carro na vaga marcada e, enquanto ela subia para o quarto, fui fechar a porta da garagem, quando verifiquei um pequeno problema no dispositivo automático do portão. Ele parava no meio do percurso. Percebi que, manualmente, ele descia até embaixo. Foi quando vi uma espécie de paralelepípedo, esses de calçamento de rua, só que um pouco maior e mais pesado no chão, ao lado do portão. Só podia ser uma ‘gambiarra’ feita de última hora pela direção do motel, pra segura-lo. Já com o espírito ‘proconiano’ baixando, pensei em fazer, posteriormente, uma reclamação mas, de momento, baixei até o final o portão, travei com a pesada pedra e subi. Ela estava no banheiro, com a porta fechada. Imaginei o que estava fazendo. Pensei em relaxar e me preparar, mas não conseguia. Um monte de pensamentos passavam pela minha cabeça. Como é fácil envolvermos e nos deixarmos envolver pelas seduções. Tentava entender o porque estava ali e, não conseguia. O que estava procurando? Que teorias antropológicas explicariam aquele comportamento que batia de frente com tudo que havia sido (imposto?) pela educação e comportamentos socialmente aceitáveis?
Foi quando ela saiu, lindamente vestida com uma langerie preta maravilhosa. Veio direto em minha direção, me abraçou e começou a me beijar calorosamente, me dizendo ao ouvido que estava apaixonada. Aí não deu mais. Entrei em parafuso e ela percebeu que alguma coisa não estava ‘funcionando’. Se afastou e me olhou com um olhar que exigia explicações. Tive que dá-las. Contei tudo. Do olhar de explicações senti que passou para um, digamos de decepção, inicialmente e, em seguida, um brilho de ódio que me fez estremecer e ficar mudo. Simplesmente pegou o telefone, ligou para a recepção e pediu um táxi que, informaram, viria em vinte minutos Maldita eficiência dessas casas acostumadas a essas situações.
- Com muito esforço tentei reverter o clima. Me ofereci veementemente, para leva-la para casa, mas fui silenciado com um abrupto: Cale a boca! Me recolhi à minha insignificância e, enquanto ela voltava ao banheiro para se trocar, fiquei tentando imaginar porque o teletransportador do Dr. Spock, ainda não estava disponível comercialmente. Era só o que queria. Na volta sentou-se na poltrona ao lado da cama, ligou o som em volume altíssimo, como que para não ouvir nem pensamentos e ficamos a espera. Mudos. Quinze minutos depois, que pareceram séculos, a recepeção liga e o táxi estava a espera. Ao me levantar, para fazer alguma, qualquer coisa, ela ordena que fique ali até sair. Desabo na cadeira novamente e acompanho com o olhar sua descida até a garagem. Foi quando, naquele silencio fúnebre, ouvi em estrondo de vidro quebrando. Fiquei alguns segundos atônito, até me dar conta do que poderia ter acontecido. Corri até a garagem e vi, aquele paralelepípedo, docilmente acomodado no banco traseiro do carro, circundado por milhares de estilhaços do vidro traseiro, enquanto ela entrava no táxi que zarpava. Agora me diga: como uma pessoa frágil como ela, conseguiu levantar e arremessar aquele peso, e com tal força que arrebentou de uma vez aquele vidro?
- É a raiva, querido. É a raiva !
- Bom, conforme o combinado, para provar a minha estória, aqui está o ticket do motel e a nota fiscal da oficina que consertou o carro.
- Belo estrago, hein? Mas, o seguro não cobre despesas com quebra de vidros?
- Esqueci de dizer. Ela trabalha em companhia de seguros. Minha apólice só cobria quebra do parabrisa. Podemos pedir a conta?

quinta-feira, abril 06, 2006

EntreActo

Agradecemos sua visita e, enquanto nossa secção de Livros&afins não fica pronta, visite nosso setor de brinquedos e jogos de passatempo, no sub-solo. Obrigado!

quarta-feira, abril 05, 2006

Tempos Modernos (II)

Lá estavam eles, na data e local combinados, após um mês. Como a ocasião era especial, mereceria um Bolla dessa vez.
Ela estava mais linda do que nunca. E mais falante que ele também. Então, ele pediu que começasse o seu relato.

- Bom, resolvi que minha tática seria ir àquele bar que íamos de vez em quando e nos divertíamos com as paqueras que rolavam, sabe qual né? Então combinei com a Tânia, que é solteira e freqüentadora mais assídua e fomos juntas. Ela já havia me dado as dicas. Se você quer uma abordagem mais ‘caliente’, tipo ‘hoje eu tô a fim’, deve olhar para a presa e dar um sorriso encorajador. Se prefere uma abordagem mais light, sem dar muitas esperanças, apenas um olhar mais firme.
Acho que ela entende bem do assunto, pois no primeiro sábado que fui ao bar, depois de um ou dois drinks, me senti confiante pra encarar e sorrir pra um rapaz, aparentemente uns dez anos mais jovem, moreno, um metro e oitenta, e só depois que eu pude conferir, uma bela barriga de tanquinho.

Nesse momento ela teve que interromper a narrativa, pois ele se engasgou ao olhar para baixo, provavelmente com algum fino espinho da aliche presente no Penne a Putanesca que havia pedido. Após a pausa para um gole d'água, continuou a narrativa.

- A abordagem, foi como a Tânia havia previsto. Sem muitas delongas, disse que eu era linda, super simpática e ficamos ali jogando conversa fora, aliás o papo dele era muito bom. Dançamos ao som do grupo que estava tocando, que por sinal era o nosso preferido, o Mustang 68 e, no final, o também previsto convite para o motel que, claro, aceitei.

Nova interrupção, dessa vez para o garçom recolher a taça de vinho dele que havia caído e se espatifado no chão.

- Ao me deixar em casa, trocamos telefones e eu não tive, digamos, coragem, de contar tudo a ele, sobre o nosso trato. Na semana seguinte, ele me liga e me convida para uma nova saída e, com o mesmo final. Vou resumir, antes que você tenha um ataque histérico em público. Os dois últimos fins de semana, passei na chácara dos pais dele, que estavam viajando. Foram maravilhosos. Ele foi super atencioso e ouvia todas as besteiras que eu falava, sempre com um sorriso encantador. Não se importava com o meu passado, e não falava praticamente nada do dele. Não estava interessado no que eu fazia ou deixava de fazer, mas no que e como eu me apresentava naquele momento. Então, no último dia contei a ele sobre a minha situação. Ele foi super compreensível, deu boas gargalhadas, me achou uma louca adorável e disse que, sempre que eu tivesse novas férias o procurasse. Estão aqui os comprovantes de pagamento, que ele fez, dos motéis, e nossas fotos dos fins de semana na casa dele. Tem umas fotos mais íntimas, mas essas eu deixei com ele, disse que não seriam necessárias, eu espero. É, aparentemente, tive um belo romance de verão. Agora é a sua vez.

terça-feira, abril 04, 2006

Tempos Modernos (I)

Eles estavam, ambos, próximos dos quarenta. E dos dez anos de casamento, também ambos, posto que eram casados um com o outro.
Ele estava preocupado com o relacionamento. Haviam ultrapassado a popular crise dos sete anos, e também a dos oito e a dos nove, mas...Agora os sinais eram inquietantes.
Resolveu que precisavam conversar. Escolheu o jantar mensal, sempre na primeira semana do mês, aproveitando o pagamento de ambos, antes que outras despesas imprevistas viessem a minguar o orçamento classe média da casa.
Como de costume na cantina do Bexiga, as variações previstas das massas prediletas, acompanhada do vinho popular Chianti italiano. Puxou o assunto. Não estava minimamente a vontade com a conversa, mas achava que precisava dizer o que sentia.
Olhava pra ela com muito carinho e sentia que era retribuído, mas alguma coisa incomodava. A conversa girava muito em torno dos problemas com o filho pequeno (cinco anos), as agruras do serviço de cada um, que infelizmente era na mesma área, então um virava consultor profissional do outro. Havia uma saudade do início, da paixão que sentiram e que, naturalmente, culminou na união sob os sagrados laços.
Agora parecia tudo estabilizado. Os afetos, a vida profissional, o futuro. Tudo muito previsível. A conversa avançava e ele não sabia bem aonde iria ou queria que ela chegasse. Até que ela surpreendeu com uma proposta, talvez percebendo, com a tradicional intuição feminina, o subtexto da situação. Já que ele tinha uma férias pendente e que, segundo indiretas da gerencia dele, seria um bom momento para tira-las, porque não aproveitar e tirarem também umas férias conjugais. Ele iria para a casa de campo que tinham, e ela continuaria na cidade e no seu trabalho. Mas férias conjugais, como assim? Com que objetivo? E ela foi direta: para verem o quanto ainda estavam ligados um ao outro, até que ponto ainda existia amor entre ambos ou apenas uma acomodação à situação, que era boa, mas parecia, pelo que ele dava a entender, que, bem...
O vinho fez a sua parte, e ambos se divertiram combinando que seriam férias pra valer, mais que isso, seria uma prova a que seria colocada a relação. Deveriam, ambos, ao final de um mês ter um caso. Isso, um caso completo, com pelo menos uma transa para, findo o período, voltarem ao mesmo restaurante, contarem como tinha sido, o que haviam sentido, sem pudores ou receios de julgamentos. E mais, deveriam, juntar e apresentar pro outro o maior número possível de provas, daquilo que tivesse acontecido.
E assim ficaram combinados.

segunda-feira, abril 03, 2006

Interlúdio

Ou eu muito me engane
Mas eu sei de seus planos
Na retina, nos olhos
Da menina
Todos seus planos

De voar, de debandar
Realçar o seu olhar
De dizer o que resta
De fazer o que presta
Música, amor,
Simpatia e festa


Essa ‘coisa’ aí em cima eu escrevi, a long long time ago, para registrar um momento mágico. O momento em que duas pessoas percebem uma mesma sintonia. Compartilham um desejo comum de se conhecerem, e anteveêm todas as delícias possíveis. O instante em que a conquista por um lado e a sedução por outro, se sentem recompensadas, únicas e loucas. Por que estou lembrando disso? Porque ontem, foi o dia que mais te amei dos muitos que estivemos juntos. Não teve sexo, embora coisas que foram ditas tenham excitado bastante, mas foi até melhor assim, porque tinha medo que ele não acompanhasse o que estava sentindo. Foi maravilhoso poder passar o tempo todo só te observando. Encantado com sua beleza, com seu jeito de menina, sua calça jeans desbotada e sua jaqueta de estimação, que você nem quis deixar no carro, dizendo, que se roubassem, o carro, afinal estávamos em Sampa, você ia sentir muita falta dela. Os poucos abraços e beijos tiveram sabor de fruta madura e suculenta tirada do pé.
Ainda resta um longo caminho a percorrer, mas a vontade de trilha-lo é muita. Os medos? Ah! Pra eles a gente dá uma banana, porque já sabemos como supera-los. O Tédio? Nossa loucura e imaginação irão dar conta. O resto?... tudo que faltar a gente inventa.

domingo, abril 02, 2006

Tesão pela vida

Hoje eu tô muito pra baixo. Diz o bom senso que nessas horas precisamos de algo super-hiper-plus edificante pra reajir. Então pra deleite de todos coloco este texto, extraido do livro 'Sem Tesão não há solução" do Roberto Freire.

"Falando do Davi (a escultura de Michelangelo exposta no Museu da Academia, em Florença), lembro-me de uma vez que os dois filhos de um turista cego o ergueram nos ombros para que ele tocasse a estátua. Esticado, ele apalpava a barriga da perna de Davi e retirava as mãos rapidamente de sobre o mármore, voltando, em seguida, a tocá-la sempre desse modo ansioso. E ficava dando risada. Centenas de pessoas, de todas as nacionalidades, que estavam ali a contemplar a estátua, acompanhavam atentas aqueles movimentos e puseram-se a rir também. Então ele se agarrou a perna de Davi, e passou a chorar. Por fim despencou sobre os ombros dos filhos que o a braçaram muito comovidos.
Segundo me disse depois um dos filhos, o pai nunca vira nada na vida, mas explodia assim quando tocava algo que fosse realmente belo. A beleza que ele percebia não estav, pois, apenas na estátua visível do Davi, mas também no que resultava do jeito como foi criada e para quem Michelangelo a criou. Isso deve ter produzido no homem cego a ludicidade vivida naquele instante, embora ele não possa saber jamais como é a beleza aparente daquela obra. Entretanto o tesão do rapaz florentino que serviu de modelo e o tesão de Michelangelo por ele, o tesão do artista pela beleza do corpo humano, tudo isso eu tenho certeza de que o cego sentiu tocando a escultura, tanto quanto todos nós que podíamos vê-la."

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