sexta-feira, abril 07, 2006

Tempos Modernos (final)

Ele já havia deixado o prato de lado e tentava reunir forças, bebericando do vinho, pra fazer a sua parte do combinado.
- A tática foi a mesma, só não consegui carregar o Edson, na sexta, que disse precisar trabalhar no sábado, e não estava a fim da esticada. Resolvi ir sozinho mesmo e, por falta de prática cheguei cedo, com o bar ainda vazio. Quando o clima esquentou é que percebi que havia me excedido na bebida e, você sabe, quando o estomago dá o berro a coisa fica crítica. Tive que gastar boa parte da noite trancado no banheiro, tentando me recuperar. Foi um fiasco total, e fui embora a ver navios. No dia seguinte, devidamente escoltado pelo amigo, e me controlando melhor, percebi um olhar, mas sem sorriso, dela que estava com outras duas amigas. Notei que das três era a mais quieta, o que me cativou naturalmente. Fiz a abordagem, meio desajeitado, mas consegui manter a conversa e leva-la para casa. Mas não senti clima para avançar o sinal. Marcamos um cinema para o dia seguinte. Nesse quesito tínhamos afinidades e fomos ver o Woody Allen que estava passando. Ao contrário do seu ‘barriga de tanquinho’, ela estava muito interessada em conhecer meu passado. Notou por exemplo a marca da aliança, que havia deixado em casa. Não teve jeito. Menti que era separado já a seis meses, que tinha um filho, uma ficha quase completa. Pintou um clima de cumplicidade e, ficamos de nos ligar durante a semana. Na seguinte, mais cinema e restaurante, a conta estava começando a ficar cara, pro Salim aqui. Foi a vez dela se abrir e contar suas desventuras amorosas, sua preocupação com a idade já avançada e ainda vivendo com os pais, apesar da independência financeira. Os esforços para se manter bela e atraente, seus medos de se envolver, mais uma vez, com a pessoa errada, mas achando que eu era diferente’, e eu já começando a me achar um crápula. Nos despedimos, até a próxima semana, que era a última do meu prazo. No telefonema no meio da semana notei que ela estava diferente. Deu a entender que queria conhecer minha casa, já que eu tinha dito que morava numa chácara, em cidade próxima da capital. Mas achei que isso estaria fora de propósito, não é?
- Ahn, Ahn!
- Foi o que pensei e deu uma desculpa que nem me lembro agora. Ela achava que eu estava escondendo alguma coisa. Por exemplo, porque quase não falava do filho, já que estava separado e, pela sua experiência, homens recém separados adoram falar dos filhos, talvez uma maneira de purgar suas culpas. Procurei desconversar e dei a entender que não daria pra continuar se ela continuasse com as desconfianças. Desliguei achando que era o fim, mas, na sexta ela liga e diz que queria sair novamente, afirmando que a desconfiança havia sido superada. Aí foi a minha vez de ficar preocupado com o rumo que as coisas estavam tomando. De qualquer forma concordei, e ficamos de nos ver à noite, sem programa definido. Ao pegá-la, não disse nada e, cheio de brios ‘cafajésticos’, me dirigi ao motel mais próximo. Ela não opôs resistência, parecia mesmo que era o que esperava que eu fizesse, considerando o sorriso maroto e o cafuné enquanto fazíamos a ficha.
- Lá chegando, entrei com o carro na vaga marcada e, enquanto ela subia para o quarto, fui fechar a porta da garagem, quando verifiquei um pequeno problema no dispositivo automático do portão. Ele parava no meio do percurso. Percebi que, manualmente, ele descia até embaixo. Foi quando vi uma espécie de paralelepípedo, esses de calçamento de rua, só que um pouco maior e mais pesado no chão, ao lado do portão. Só podia ser uma ‘gambiarra’ feita de última hora pela direção do motel, pra segura-lo. Já com o espírito ‘proconiano’ baixando, pensei em fazer, posteriormente, uma reclamação mas, de momento, baixei até o final o portão, travei com a pesada pedra e subi. Ela estava no banheiro, com a porta fechada. Imaginei o que estava fazendo. Pensei em relaxar e me preparar, mas não conseguia. Um monte de pensamentos passavam pela minha cabeça. Como é fácil envolvermos e nos deixarmos envolver pelas seduções. Tentava entender o porque estava ali e, não conseguia. O que estava procurando? Que teorias antropológicas explicariam aquele comportamento que batia de frente com tudo que havia sido (imposto?) pela educação e comportamentos socialmente aceitáveis?
Foi quando ela saiu, lindamente vestida com uma langerie preta maravilhosa. Veio direto em minha direção, me abraçou e começou a me beijar calorosamente, me dizendo ao ouvido que estava apaixonada. Aí não deu mais. Entrei em parafuso e ela percebeu que alguma coisa não estava ‘funcionando’. Se afastou e me olhou com um olhar que exigia explicações. Tive que dá-las. Contei tudo. Do olhar de explicações senti que passou para um, digamos de decepção, inicialmente e, em seguida, um brilho de ódio que me fez estremecer e ficar mudo. Simplesmente pegou o telefone, ligou para a recepção e pediu um táxi que, informaram, viria em vinte minutos Maldita eficiência dessas casas acostumadas a essas situações.
- Com muito esforço tentei reverter o clima. Me ofereci veementemente, para leva-la para casa, mas fui silenciado com um abrupto: Cale a boca! Me recolhi à minha insignificância e, enquanto ela voltava ao banheiro para se trocar, fiquei tentando imaginar porque o teletransportador do Dr. Spock, ainda não estava disponível comercialmente. Era só o que queria. Na volta sentou-se na poltrona ao lado da cama, ligou o som em volume altíssimo, como que para não ouvir nem pensamentos e ficamos a espera. Mudos. Quinze minutos depois, que pareceram séculos, a recepeção liga e o táxi estava a espera. Ao me levantar, para fazer alguma, qualquer coisa, ela ordena que fique ali até sair. Desabo na cadeira novamente e acompanho com o olhar sua descida até a garagem. Foi quando, naquele silencio fúnebre, ouvi em estrondo de vidro quebrando. Fiquei alguns segundos atônito, até me dar conta do que poderia ter acontecido. Corri até a garagem e vi, aquele paralelepípedo, docilmente acomodado no banco traseiro do carro, circundado por milhares de estilhaços do vidro traseiro, enquanto ela entrava no táxi que zarpava. Agora me diga: como uma pessoa frágil como ela, conseguiu levantar e arremessar aquele peso, e com tal força que arrebentou de uma vez aquele vidro?
- É a raiva, querido. É a raiva !
- Bom, conforme o combinado, para provar a minha estória, aqui está o ticket do motel e a nota fiscal da oficina que consertou o carro.
- Belo estrago, hein? Mas, o seguro não cobre despesas com quebra de vidros?
- Esqueci de dizer. Ela trabalha em companhia de seguros. Minha apólice só cobria quebra do parabrisa. Podemos pedir a conta?

3 Comments:

At abril 07, 2006 7:02 PM, Blogger valter ferraz disse...

mas assim, no más? Num teve uma segunda chance? Aí é de fuder mesmo ou não, no caso é ou não. Eu sempre faqlo, vc teoriza demais, tem horas que é preciso partir para a ação, uma pegada mais forte, entende?

 
At abril 08, 2006 9:19 AM, Anonymous Anônimo disse...

muito bommmm! A experiência masculina, foi mais interessante.

 
At abril 09, 2006 9:25 AM, Blogger valter ferraz disse...

visto do seu lado, né? Já por outro lado, tô achando uma puta mentira, coisas do cérebro atrofiado de algum desenvolvedor de sistemas. Cai na real, vagabundo!

 

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