segunda-feira, setembro 04, 2006

Um dia de domingo

Odeio domingos!
Não é o dia todo, vale dizer. A manhã até que é gostosa. Comprar o pão quentinho, tomar café lendo Élio Gaspari e companhia, na Folha. Planejar o almoço. Ficar no ‘dolce far niente’ ou, se estiver sol, ir até o clube e ‘far niente’ por lá.
O problema começa depois do rango. Aí, em geral, bate um vazio, apesar do estomago cheio. Acho que isso é resquício da adolescência, quando tinha o conjunto e as tardes eram para ensaiar.
Aquele grupo de amigos tentando fazer música, trancados na autêntica sauna que era o quarto de ensaios, construído sem janelas, exatamente para não vazar som e incomodar a sesta dos vizinhos e dos pais. As discussões acaloradas. O Antonio (vocalista) literalmente empapado de suor, torcendo a camiseta encharcada. O mundo seria diferente, com certeza, com nossos planos mirabolantes. Era-nos inconcebível desperdiçar aquelas tardes dormindo. Era o momento de expor as idéias musicais e poéticas de cada um, gestadas durante a semana. Muitas vezes havia frustração quanto aos resultados conseguidos. Mas isso não importava, muito.
Até hoje, sem nada de especial para fazer, luto contra esse sono vespertino. É um horário em que até o vento se retira e fica tudo estático. As tardes mornas, ou seriam mortas? Todos procurando recuperar as forças exauridas, para reiniciar o ciclo do trabalho.
As noites, então, são verdadeiro suplício. A leseira da tarde se tranforma em inanição completa e, o simples levantar do sofá, nossa, nem pensar meu rei!
Outro dia, domingo por certo, fazendo uma caminhada pelas ruas da infância e adolescência, senti toda essa atmosfera carregada. Passar pelo CDM, em cujas quadras jogávamos o futebol, e ver ele dominado por um bar que emitia um pagode ensurdecedor e distorcido, enquanto pilhas de garrafas de cerveja explicavam o olhar fixo e vazio de seus consumidores. O quintal da General Severiano, que não tem mais o pé de limão, nem o galpão de quinquilharias do seu Leon, que aguçava nossa curiosidade e temores infantis. Foi substituído por um sobrado de fundos, provavelmente para dar abrigo ao filho(a) que casou, e ficou morando por ali, premido pelas dificuldades econômicas.
Chegar em casa e ver o filho deitado no sofá, dormindo, com a TV ligada no Faustão, esperando o inicio do indefectível jogo de futebol. As mulheres conversando, depois da cozinha arrumada, assuntos que não me interessam.
Se sentir preso na engrenagem da máquina de fazer doidos, sem forças, sem planos. Ainda bem que sou só eu que sinto isso. Poderia ser pior? Claro que poderia. Isso é só um pesadelo. É só dar uma chacoalhada na cabeça e acordar. Ir até o Astros e tomar um mojito que passa.
Em tempo, só pra não ficarem me achando um E.T. dominical, existe uma situação especial que é o domingo com feijoada, a autêntica, herdada da senzala. Aí tem que ter os três C’s. Caipirinha antes, cerveja durante e cama depois, que ninguém é de ferro.

3 Comments:

At setembro 04, 2006 11:34 PM, Anonymous Anônimo disse...

O texto ficou um primor e vc sabe disso mas eu não ppsso perder a oportunidade de dizer: Eu acho que vc está ficando velho e com nostalgia da adolescência....!!!!!

 
At setembro 07, 2006 1:56 PM, Anonymous Anônimo disse...

Obrigado pelo elogio ao texto. Quanto a 'nostalgia da adolescência' é que estou numa fase 'revival'. Assim como os pesadelos, daqui a pouco passa, e a gente volta ao 'melhor lugar do mundo é aqui e agora'.
Um abraço.

 
At setembro 11, 2006 4:42 PM, Blogger valter ferraz disse...

Aquele quintal era tudo de bom, não? Nostalgia da adolescência? Pode ser, mas que era bom, ô se era. A gente ía fazer tudo diferente, nossos filhos, ah os nossos filhos seriam diferentes. Bão, algumas coisas são diferentes, outras nem tanto. De minha parte atualmente todos os dias são domingo e está ótimo. Vem prá Mongaguá vc também, vem.

 

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