sexta-feira, março 17, 2006

Mais do mesmo (assunto)

Bem, vamos soprar as teias de aranha desse blog e escrever um pouco.
Gostaria de falar do programa “Re-corte Cultural” que passa na TVE do Rio, captada pelas parabólicas aqui da região. Os pontos altos do programa são o apresentador, que faz entrevistas com pessoas diversas da área cultural (música, literatura, cinema, etc) e a estrutura fragmentada, re-cortada, da montagem, que vai mostrando, alternadamente, trechos das entrevistas com dois ou mais convidados de cada edição, entremeados com clipes, gingles, ilustrações as mais diversas do tema ou obra da pessoa entrevistada.
Consumado o jabá inteiramente grátis, passemos para a entrevista feita com um tal de Alcione Araújo, escritor e roteirista de cinema. Não o conhecia, mas o achei grande figura. O tema principal era educação e cultura, assuntos que me são muito importantes, e que eu acredito ser o principal problema do Brasil.
Parece que está se formando um consenso quanto a importância da educação como principal alavanca para o desenvolvimento. Por isso, além de se identificar o problema, é importante saber como atuar para resolve-lo. Daí que achei interessante a colocação feita nessa entrevista. A constatação é que a educação sofreu uma mudança de foco ao longo das últimas décadas. Passamos gradativamente de um modelo educacional europeu, centrado em uma grade que privilegiava mais os aspectos ‘humanísticos’ (latim, filosofia, história, etc) para um modelo mais ‘americanizado’, onde o importante é o adestramento do aluno para a produção, a fim de acompanhar o acelerado desenvolvimento tecnológico atual.
Conseqüências dessa mudança de foco: a própria produção cultural, ou seja os artistas encarregados dessa produção, começam a ter dificuldades de se comunicar com o público, passando a nivelar por baixo sua produção cultural, a fim de atingir uma audiência maior, ou alguma audiência.
Dados estarrecedores: para uma população diretamente envolvida com educação, basicamente alunos e professores, de 55 milhões existentes no país, temos como tiragem média de um livro 3000 exemplares. Pouco não.
Me lembro que, na infância, descobri em casa um baú com livros do meu pai, romances basicamente, comprados do Círculo do Livro, onde haviam várias dezenas de exemplares. De memória recordo de Mobi Dick de Melville, alguns Machado de Assis, José de Alencar, Eça de Queiroz, Camões, etc. Detalhe: nunca vi meu pai lendo um livro, ele que nem terminou o ginásio. A conclusão é que havia uma cultura, um charme, ou sei lá o que, em possuir livros. Isso me parece que hoje se perdeu, e muito. Outro indicador: na escola estadual em que fiz o ginásio e o colégio, havia uma biblioteca onde, independente de qualquer solicitação de professores, li quase todos os Monteiro Lobato, Hans Staden, Robinson Crusoé, e outros da literatura infanto-juvenil que me deram o gosto pela leitura como lazer e não como obrigação escolar. Hoje, perguntando pra minha filha que saiu da escola paga para a pública, a mesma que cursei, se havia ainda essa biblioteca, ela não soube me dizer com certeza. Parece que existe, mas ela ainda não sabe onde fica e como funciona.
Alguma coisa precisa ser feita para resgatar essa magia da leitura, não como obrigação.
Um tempo atrás, oito ou nove anos, era sócio da biblioteca circulante (municipal) que havia na Praça Roosevelt, em Sampa, onde, a cada quinze dias devolvia e retirava um livro para leitura. Um belo dia constatei que ela estava fechada, transferida, provisóriamente, para um outro endereço próximo, e posteriormente desativada. O porquê, nunca entendi. Até hoje o prédio continua vazio.
É claro que existem boas escolas, onde todos esses requisitos são atendidos. Mas o ponto é: isso ficou privilégio de uma elite, quando, antes era uma coisa acessível a todos os estudantes.
Não basta uma educação massificada, tipo todas as crianças na escola. Mas fazendo o que? Aprendendo o que? A pensar ou apenas a decorar?
Essa semana acompanhei a conversa de duas professoras, no trem para o trabalho. Falavam sobre a monstruosidade da aprovação automática, que veio substituir a “mostruosidade” da reprovação. Será que houve algum ganho? Isso não explicaria a incapacidade funcional de jovens formados, mas com dificuldades de entender e de se expressar verbalmente? A tecnologia, a internet são ferramentas maravilhosas, mas não estariam sendo sub-utilizadas? Nada substitui o pensar por si mesmo, a capacidade de questionar, criticar, analisar, tirar conclusões.
Tô com sono. Fui dormir. Inté!

6 Comments:

At março 17, 2006 11:24 AM, Blogger valter ferraz disse...

passei aqui, parei mas não posso comentar,estou de saída.Mas volto porque o assunto muito me interessa.
até já

 
At março 18, 2006 8:07 AM, Blogger valter ferraz disse...

wilson, mudei a URL do blog, agora é: perplexoinside.blogspot.com

 
At março 18, 2006 11:57 AM, Blogger valter ferraz disse...

Então, tô devendo um comentário e vou tomar cuidado com os erros de digitação, viu?
Olha a escolha do modelo americano que vc fala, se deu não só no aspecto da educação, mas em todas as esferas.Quando na década de 30,Getúlio e cia, escancaram as portas do país para os americanos, adotou-se todo um american-way-of life, com tudo o que isso pode acarretar.Optamos p/privilegiar o transporte rodoviário em detrimento ao ferroviário;a indústria siderúrgica, voraz consumidora de minério de ferro, essa devastadora atividade, fundições de alumínio,etc. Na cultura deu-se o mesmo.Deu que não fizemos nem uma coisa,nem outra.Ficamos no meio do caminho.Nosso problema hoje é de educação básica.Um país de analfabetos funcionais.Pegue um texto escrito por advogados, médicos,engenheiros e veja a dificuldade de expressão,de redação,de interpretação de textos.Como um país que não privilegia a educação pode dar um salto no desenvolvimento?Passamos da exploração ambiental devastadora para a desindustrialização sem termos vivido a fase da industrialização plena e efetiva. Sobreviveremos?

 
At março 21, 2006 7:23 PM, Blogger jayme disse...

Wilson, antes de dormir, me diga, vc conheceu a biblioteca da Praça Roosevelt?

 
At março 21, 2006 10:52 PM, Blogger wilson falchi disse...

Desculpem o atraso nas respostas, mas vamos lá.

Ana, para romper o círculo, inicialmente é necessário um consenso sobre os problemas. Acho que isso está começando a ocorrer. Como você mesmo detectou, pode-se começar por melhorar a qualidade e o reconhecimento da importância dos professores, oferendo, por exemplo, facilidades para cursos de reciclagem, mas é preciso investimento.

Valter, não sei se tudo que foi feito foi errado. é preciso considerar as circunstâncias do momento. De qualquer forma ainda acho melhor termos uma educação que privilegia a formação e não apenas a informação, pois, por mais que hoje em dia o avanço tecnológico exija cada vez mais respostas rápidas, uma pessoa bem formada sempre estará mais apta a atender essas demandas do que quem apenas digeriu uma grande de 'informações', mas não consegue aprender por conta própria.

Jayme, obrigado pela visita. Estou em falta com seu blog, assim como vários outros que admiro. Conheci a biblioteca da Pça Roolsevelt quando trabalhava a cerca de cem metros dela. Era frequentador assíduo. Hoje leio que o Pecus frequenta também uma delas. Isso não pode acabar. Atualmente procuro me abastecer em sebos, por exemplo o do Messias, próximo ao velório municipal, que conheci em momento adverso. Com o preço dos livros, essas alternativas são a tábua de salvação dos menos afortunados financeiramente. Um abraço.

 
At março 22, 2006 8:36 AM, Blogger valter ferraz disse...

Aí, o velho lobo saiu da toca! Boa.Junte-se aos bons.
Tem fotos lá no blog, vai ver o que vc aprontou, eeheheh. O ballantines tava ótimo.

A biblioteca da roosevelt era meu ponto de abastecimento tb.Depois quando trabalhava no safra da paulista eu pegava livros alí na frei caneca.hoje não tem nem uma e nem outra.Pena. Vc sabe que seu quiser pegar um livro eu tenho que ir até o centro cultural vergueiro?
maus de 45km!
abraço

 

Postar um comentário

<< Home

Free Web Counters
Website Counters
eXTReMe Tracker